A HISTÓRIA DOS BATISTAS: O INÍCIO NO MUNDO
- Prof. Gildo Gomes
- 12 de jul.
- 5 min de leitura

Ao ouvirmos a expressão “batista” nomes como William Carey, John Bunyan, Benjamin Keach e principalmente o príncipe dos pregadores, Charles Spurgeon nos veem a mente. É muito comum encontrarmos uma igreja batista no Brasil, mas sabemos que o movimento não começou em nosso país. Então, qual a origem dos batistas no mundo? É verdade que os batistas são os sucessores históricos dos anabatistas? O nome batista tem alguma relação com João Batista? No estudo histórico dos batistas precisamos diferenciar os mitos dos fatos para conhecermos corretamente quem somos. Numa série de artigos pretendemos esclarecer com fontes fidedignas a história e teologia dos batistas no mundo. Infelizmente muitas igrejas hoje que fazem uso do nome “batista” sequer conhecem a história e identidade desse ramo protestante. Quem imaginou que no século XX teríamos tantas igrejas batistas “pentecostalizadas”1 ou “neopentecostalizadas”? Tais igrejas são nominalmente batistas, mas na prática negam a identidade e os distintivos batistas: Igreja confessional (confissão de fé); batismo de crentes por imersão (credobatismo); membresia regenerada (pessoas salvas); aplicação da disciplina eclesiástica e autonomia local da congregação (governo congregacional), pregação das doutrinas da graça2 (teologia reformada) e, evangelização e comunhão dos santos3.
OS BATISTAS: ORIGEM E CONTEXTO HISTÓRICO
Diferente da Alemanha, Suíça e outros países da Europa, a reforma na Inglaterra aconteceu mais por motivos políticos que teológicos. A ruptura com a Igreja Católica Romana se deu pelo desejo do rei Henrique VIII (1509-1547), em anular seu casamento com Catarina de Aragão. Num acordo político entre Inglaterra e Espanha, Catarina aos quinze anos se casa com Arthur, irmão de Henrique. Quatro meses após o casamento ele falece. A aliança entre os reinos continua com o matrimônio da viúva com Henrique, o novo herdeiro do trono inglês. Apesar da lei canônica proibir o casamento de uma viúva com seu irmão, houve uma dispensa papal4. Com dúvidas da validade do casamento e filhos que não sobreviviam, Henrique solicita ao papa Clemente VII a anulação da união matrimonial. A negação do pedido faz Henrique VIII romper com Roma, não envia mais dízimos a Igreja Católica e confisca suas terras e riquezas na Inglaterra5. Assim surge a Igreja Anglicana. Com a morte de Henrique VIII, seu filho Eduardo VI o sucedeu e tornou a Igreja Anglicana protestante. Eduardo, muito enfermo reinou apenas seis anos (1547-1553) e foi sucedido por sua irmã, Maria Tudor (1553-1558), filha de Catarina de Aragão e conhecida como “Maria, a sanguinária”, pela perseguição aos protestantes. Após seu curto reinado, ocorreu o longo reinado de Elizabeth I (1558-1603). Nessa época os puritanos – nome pejorativo aos protestantes que queriam purificar a Igreja Anglicana dos traços católicos, começaram a separar-se do anglicanismo dando origem aos batistas, presbiterianos e congregacionais.
OS BATISTAS GERAIS E PARTICULARES
Os batistas, portanto, se originam em solo inglês no início do século XVII como fruto do movimento separatista puritano. Os grupos de batistas na época foram os gerais (arminianos) e particulares (calvinistas). Batistas gerais criam na expiação universal (geral) de Cristo por todos; enquanto os batistas particulares proclamavam a morte intencional (particular) de Cristo por sua igreja. Os gerais são de 1609, com o teólogo John Smyth e seu amigo Thomas Helwis, um rico advogado, que migraram para a Holanda devido a perseguição religiosa na Inglaterra. O pequeno grupo veio a dividir-se devido as atitudes de constantes mudanças e heresias de Smith como o “sebatismo” – batizou a si mesmo6, a negação do pecado original, adesão aos menonitas e a negação da humanidade de Cristo. Com isso Thomas Helwis o deixou e voltou com 10 ou 12 pessoas da Holanda para a Inglaterra e iniciou a igreja batista em 1612. O historiador brasileiro, Zaqueu Moreira de Oliveira7 está correto em defender Thomas Helwys (1550-1616) como fundador dos batistas gerais (arminianos) no lugar de John Smyth (1570-1612). Nessa época o batismo ainda era realizado por aspersão.
Os batistas particulares (reformados) surgem décadas depois e distintamente dos batistas gerais. Claro, eles não se formam da noite para o dia. Em 1616, temos a Primeira Igreja Congregacional com o pastor Henry Jacob. Suas crenças não são todas batistas, mas sua Confissão de Fé8 influenciará os batistas particulares, principalmente na eclesiologia. Devido a perseguição, Jacob foge para a América do Norte e deixa o pastorado em 1622. A congregação passa aos cuidados de John Latrop e Henry Jessey. Na história ficou conhecida como a Igreja JLJ, as letras dos nomes de seus três primeiros pastores: Henry Jacob (1563-1624), John Latrop (1584-1653) e Henry Jessey (1601-1663)9. E assim em 1638, John Spilsbury (1598-1668) é o pastor da primeira congregação distintamente batista particular (reformada). A teologia de Spilsbury era calvinista e ele considerava o arminianismo como inimigo do triunfo de Deus. Ele cria que a afirmação do livre-arbítrio, a crença na expiação universal e de que o crente poderia apostatar, era “uma doutrina que vem de baixo, e não de cima, e seus mestres de Satanás, e não de Deus, devendo ser rejeitados como aqueles que se opõem a Cristo e a seu evangelho”10. Nessa congregação não se praticava o pedobatismo, e os crentes sofreram perseguição pela defesa do credobatismo. Nesse tempo os batistas iniciaram o batismo por imersão. No século XVII o batismo infantil esteve no olho do furacão. O livreiro londrino George Thomason reuniu mais de 125 panfletos entre 1642 e 1660 sobre o tema. Nesse tempo aconteceram cerca de 79 debates públicos entre pedobatistas e credobatistas11. E os batistas particulares (reformados) escreverão suas confissões de fé e catecismos, assunto de nosso próximo artigo.
Notas e Referências bibliográficas
[1] As igrejas batistas tradicionalmente confessam o cessacionismo, mas existem os “batistas continuístas” e os “batistas pentecostais”. Os primeiros permanecem na convicção bíblico-histórica de que todos são batizados no Espírito Santo na conversão; enquanto os segundos defendem erradamente o batismo no Espírito Santo como uma experiência que segue a conversão, evidenciado por falar em línguas (doutrina da evidência inicial);
[2] No caso dos batistas reformados, pois apesar dos batistas arminianos professarem a “perseverança dos santos”, no entanto negam contraditoriamente as demais doutrinas da graça;
[3] História dos Batistas, Anthony L. Chute, Nathan A. Finn e Michael A.G. Haykin. Editora Pro Nobis, 2022. p. 409-433;
[4] História Ilustrada do Cristianismo Vol II, Justo L. González. Vida Nova, 2011, p. 71
[5] Teologia Bíblica Batista Reformada, Fernando Angelim. Estandarte de Cristo, 2020, p. 41
[6] Um povo chamado batista, Zaqueu Moreira de Oliveira. Editora Kairós, 2014, p. 65
[7] Liberdade e Exclusivismo, Zaqueu Moreira de Oliveira. Editora Horizontal, 1997, p. 21,66
[8] O resumo dessa Confissão de Fé pode ser visto nas palestras proferidas nas Conferências Puritanas e Westminster (1959-1978) na obra “Os Puritanos suas origens e seus sucessores” de D.M. Lloyd-Jones. PES, 1993
[9] Um povo chamado batista, Zaqueu Moreira de Oliveira. Editora Kairós, 2014, p. 69
[10] Os Batistas e as Doutrinas da Graça, Thomas Nettles. Editora Pro Nobis, 2024, p. 73
[11] Teologia Puritana, Joel R. Beeke & Mark Jones. Vida Nova, 2016, p. 1025
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