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A HISTÓRIA DOS BATISTAS: O CONFESSIONALISMO

  • Foto do escritor: Prof. Gildo Gomes
    Prof. Gildo Gomes
  • 1 de ago.
  • 8 min de leitura

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“Não temos credos, a não ser a Bíblia!” é uma declaração que para alguns resume a tradição dos batistas1. Tal afirmação começou no século XIX com o clérigo irlandês-americano Alexandre Campbell (1788-1866) que fora um batista por 17 anos. Ao desejar um retorno ao cristianismo primitivo, intitulou-se “reformador” e passou a combater os credos e confissões utilizados nas igrejas batistas2. A alegação partia de uma compreensão equivocada do “sola Scriptura”, ou a suficiência da Bíblia crida e ensinada pela Reforma do século XVI. Os reformadores não igualaram e nem colocaram a tradição acima da Bíblia como fazia o romanismo, porém não a isolaram da tradição. Na Reforma Protestante o sola Scriputura não era “nuda scriputura” ou scriptura solitária. Os reformadores seguiram o exemplo de Cristo que repreendeu os fariseus ao usarem a tradição para invalidar a palavra de Deus (Mt 15.5,6).  A importância e necessidade no uso das confissões para a vida da igreja é vista nas palavras de Phillip Schaff3: “A Bíblia revela a verdade em forma popular de vida e fato; o Credo declara a verdade em forma lógica de doutrina. A Bíblia é para ser crida e obedecida; o Credo é para ser professado e ensinado”. E de modo mais claro, Paulo Anglada4, escreveu: “Uma igreja sem confissão é como um partido sem ideologia, como uma sociedade sem estatuto, ou como um país sem constituição. Não há coerência, nem unidade, nem estabilidade, nem fidelidade e nem disciplina”. O teólogo batista, Rhyne R. Putman5 faz uma boa comparação da Escritura e a tradição confessional entre o sol e a lua. O sol é uma estrela e tem luz própria, enquanto a lua é um astro que recebe luz do sol. Uma confissão de fé recebe sua luz e significado da fonte – a escritura, inspirada pelo Espírito Santo. Mas assim como a lua, sem luz própria, clareia na escuridão, uma confissão de fé ilumina-nos em meios as trevas das falsas doutrinas e conceitos confusos. E foi em meio a tempos difíceis que os batistas particulares (reformados) do século XVII publicaram duas confissões e três catecismos6: A Primeira Confissão de Londres (1644), A Segunda Confissão de Londres (1689), Um Catecismo para Criancinhas & Pequeninos (1652 – Henry Jessey), Catecismo Ortodoxo (1680 – Hercules Collins) e o Catecismo Batista (1693 – William Collins & Benjamim Keach)7. O objetivo era para “conservarmos firme a nossa confissão (Hb 4.14), pois como disse Jesus: “Portanto, todo aquele que me confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante do meu Pai que está nos céus” (Mt 10.32-33). 

 

OS BATISTAS E A CONFISSÃO DE FÉ DE 1644

A Primeira Confissão de Londres (1644), elaborada nessa região da Inglaterra é a confissão mais antiga dos batistas particulares (reformados), publicada por sete igrejas que eram “as pobres e desprezadas igrejas de Deus em Londres”. Por serem contrários ao pedobatismo (batismo infantil), os batistas eram duramente criticados pelos católicos e protestantes, e para piorar eram confundidos e tratados como se fossem anabatistas. A própria confissão já dizia explicitamente: “Uma Confissão de Fé de Sete Congregações ou Igrejas de Cristo, que são comumente (embora injustamente) chamadas de anabatistas”8. Na confissão os próprios batistas reformados afirmam claramente que não são anabatistas e isso deveria encerrar o assunto para aqueles que teimam em explicar as origens batistas no anabatismo, assunto que será tratado no próximo artigo. Por enquanto, basta saber que os anabatistas eram arminianos antes de Armínio8, e a confissão de 1644 é inteiramente contrária ao livre-arbítrio, proclama as doutrinas da graça e rejeita o arminianismo. A Confissão de Fé de Londres de 1644, é a primeira na história moderna a defender o batismo por imersão. Em maio de 1640, a Igreja JLJ (Jacob-Latrob-Jessey) cresceu ao ponto de reunir-se em dois lugares. Nesse tempo o batismo por imersão veio à tona através de Richard Blunt. O “Manuscrito Kiffin”(MSK)9 registra: “Sr. Richard Blunt... estando convencido de que o batismo, que também deveria acontecer ao mergulhar o corpo na água, assemelhando-se a um sepultamento e uma ressurreição... propôs uma reunião na igreja sobre o assunto”10. Após, a congregação de John Spilsbury adota o batismo imerssionista e ele escreve um tratado em defesa da prática da imersão11.  Acredita-se que Spilsbury, além de signatário original, seja o autor da confissão de 1644. A prática de mergulhar as pessoas no batismo trouxe acusações injustas aos batistas ao ponto do anglicano, Daniel Featley difamá-los e dizer que ficavam “completamente nus... homens e mulheres juntos, em seus rios, ao serem mergulhados”. No final da Confissão Batista de 1644, composta de 52 artigos de fé, acrescentou-se um apêndice, escrito por Benjamin Cox, para esclarecer mais ainda a questão do batismo12. Rejeitar o pedobatismo na época significava romper com a igreja estatal onde o batismo infantil era obrigatório para a cidadania. 


OS BATISTAS E A CONFISSÃO DE FÉ DE 1689

O século 17 produziu as três confissões de fé protestantes mais famosas no mundo: A Confissão de Fé de Westminster (CFW,1646), A Declaração de Savoy (DS,1658) e a Confissão de Fé Batista (CFB1689). Após a publicação da Primeira Confissão de Fé Batista (1644), surgiu na Inglaterra dois documentos confessionais muito bem escritos e estruturados – Westminster e Savoy. Com o crescimento dos batistas reformados, a perseguição e injustiça principalmente por causa do credobatismo, a existência de duas confissões pedobatistas e a escassez da primeira confissão (1644)13, era necessário reafirmar a fé batista de modo mais sistemático, claro e bíblico. Surge então a Segunda Confissão de Londres ou Segunda Confissão Batista (CFB1689), redigida em 1677, pelos pastores da Igreja Petty France em Londres, Neemias Coxe e William Collins14. Na composição da CFB1689 usou-se como fonte a Primeira Confissão (1644) e as Confissões de Westminster e de Savoy. 

Geralmente se questiona o porquê da confissão ser conhecida pelo ano de 1689, já que a mesma foi escrita em 1677. A razão disso é que na Assembleia Geral de 1689, representantes de 108 igrejas batistas particulares (reformados), endossaram a Confissão e por isso ficou conhecida como Confissão de Fé Batista de 1689 (CFB1689), nos seguintes termos: “Nós, os ministros e mensageiros de, e preocupados com, mais de cem IGREJAS BATIZADAS, na Inglaterra e no País de Gales (negando o arminianismo), estivemos reunidos em Londres, a partir do terceiro dia do sétimo mês, no ano de 1689, para considerarmos algumas questões que devem ser para a glória de Deus e para o bem dessas congregações. Pensamos em nos encontrar (para a satisfação de todos os demais cristãos que diferem de nós no ponto do batismo) para recomendar à sua leitura a confissão de nossa fé (impressa e vendida pelo Sr. John Harris no Harrow em Poultley); confissão essa feita por nós mesmos, como contendo a doutrina de nossa fé e prática, e desejamos que os próprios membros de nossas igrejas sejam supridos com ela”.15 


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OS BATISTAS E OS CATECISMOS

Nos símbolos da fé enquanto as confissões tem um caráter mais oficial de uma determinada igreja ou movimento, os catecismos são resumos da fé cristã, estruturados em perguntas e respostas para instrução do povo de Deus. A expressão catecismo, aparece na forma verbal grega em Gálatas 6.6, traduzido no português como “dar instrução”16. Tempos depois o termo tornou-se técnico e surgiu “catecismo”. Na Assembleia Geral de 1689, solicitou-se a William Collins que providenciasse uma versão batista do Breve Catecismo de Westminster. O registro da época diz: “Que seja elaborado um catecismo, contendo a substância da religião cristã, para instrução das crianças e servos, e se deseja que o irmão William Collins o elabore”17. Por fim os três catecismo batistas da época são: Um Catecismo para Criancinhas & Pequeninos (1652 – Henry Jessey), Catecismo Ortodoxo (1680 – Hercules Collins) e o Catecismo Batista (1693 – William Collins & Benjamim Keach). O último é um complemento valioso da Confissão de Fé Batista de 1689. Comparando-se a confissão a um texto o catecismo seria uma nota de rodapé. Dessa forma esses documentos como disse Carl R. Trumam, é uma “prova positiva de que os batistas dispõem de uma herança confessional”.18 



Notas e Referências bibliográficas

[1] Em nossa época um exemplo é o do renomado Dr. Craig S. Kenner ao dizer que “um dos motivos que gosto de ser batista é o fato de não devermos ter outro “credo” além das escrituras”. Ele afirma isso em sua obra “O Espírito na Igreja”, publicado por Vida Nova, 2018. p. 197, nota 2;

[2] Os Batistas e o Resgate da Tradição Cristã, (org.) Matthew Y. Emerson; Christopher W. Morgan e R. Lucas Stamps. Editora Pro Nobis, 2021, p. 54,55;

[3] Eu Creio, Hermisten Maia Pereira da Costa. Edições Parakletos, 2002, p. 13 

[4] Sola Scriptura, Paulo Anglada.  Editora Puritanos, 1998, p. 21;

[5] Os Batistas e o Resgate da Tradição Cristã, (org.) Matthew Y. Emerson; Christopher W. Morgan e R. Lucas Stamps. Editora Pro Nobis, 2021, p. 81;

[6] A Fé Batista – Documentos da Fé Cristã, Histórica, Batista, Reformada e Confessional. Editora Estandarte de Cristo, 2020, p. 53-322;

[7] Essas são as principais e não as únicas confissões batistas. William L. Lumpkin compilou umas quarenta confissões influentes na história dos batistas, conforme destaca David Bledsoe e Thomas Nettles na obra A Confissão de Fé de New Hampshire, pela editora Pro Nobis, 2022, p. 78 nota 33

[8] Por quem Cristo morreu? David Alen. Editora Carisma, 2019, p. 574,575;

[9] O “Manuscrito Kiffin” recebe esse nome por ser escrito pelo pastor William Kiffin, um dos influentes membros da primeira igreja batista, pastoreada por John Spilsbury, iniciada em 1638. No site https://rastrodeagua.wordpress.com tem-se um artigo sobre a história dos batistas e o Manuscrito Kiffin traduzido para o português;

[10] História dos Batistas, Anthony L. Chute, Nathan A. Finn e Michael A.G. Haykin. Editora Pro Nobis, 2022. p. 43; 

[11] Defendeu-se por muito tempo que John Spilsbury, pastor da primeira igreja batista particular (reformada) escreveu o primeiro tratado sobre o assunto em 1643. Hoje sabe-se que o pastor batista geral (arminiano), Edward Barber escreveu em 1641, um tratado sobre o batismo por imersão.

[12] O tratado mais famoso e popular sobre o credobatismo e a imersão é o livro “Batismo, um tratado batista sobre o credobatismo” de 1672, escrito por John Norcott, um ministro puritano e sucessor de Spilsbury no pastoreio da congregação Waipping (Inglaterra) em 1670. O livro foi reimpresso e publicado em diversos idiomas ao longo do tempo. Charles Spurgeon (1834-1892) o imprimiu várias vezes. No Brasil, a editora Pro Nobis publicou-o no ano de 2021;

[13] James Renihan lembra que a Primeira Confissão Batista (1644) ficou tão escassa que Benjamin Keach que subscreveu a Segunda Confissão (1689), disse no ano de 1692, não conhecer a primeira. Edificação e Beleza – A Eclesiologia Prática dos Batistas Particulares Ingleses (1675-1705), James Renihan. Editora Estandarte de Cristo, 2022, p. 49; 

[14] Uma Exposição Moderna da Confissão de Fé Batista de 1689, Samuel Waldrow. Editora Estandarte de Cristo, 2021, p. 551,552

[15] Edificação e Beleza – A Eclesiologia Prática dos Batistas Particulares Ingleses (1675-1705), James Renihan. Editora Estandarte de Cristo, 2022, p. 63; 

[16]. A Bíblia do Peregrino traduz Gálatas 6.6 assim: “O catecúmeno deve repartir seus bens com seu catequista”. 

[17] Introdução a Confissão de Fé Batista de 1689, James M. Reninhan. Editora Estandarte de Cristo, 2020, p. 104; 

[18] O Imperativo Confessional, Carl R. Truman. Editora Monergismo, 2012, p. 175;


 
 
 

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